Esse é um texto sobre um ponto de vista pessoal, não é uma recomendação de compra de ações ou dica para tomada de decisão, mas vou tentar usar alguns racionais de acontecimentos da última semana, para dar minha visão sobre os impactos na economia nas empresas recorrentes e, porque elas sofrem menos que as transacionais em períodos como esse.
Particularmente, liguei para alguns clientes da Vindi para sentir o “clima” deles em analisar os possíveis impactos que vão seguir nos próximos dias. Há uma preocupação. E, sabemos o porque dela: a maioria das empresas brasileiras não tem “caixa” para aguentar uma recessão de 1 ou 2 meses.
Negócios podem quebrar fortemente.
Empresas recorrentes e a crise do Coronavírus
Desde o começo da semana passada, o mercado e a economia local sentiram o impacto no mercado brasileiro e dois fatores contribuíram para esse cenário: a crise do petróleo e a pandemia do Coronavírus. Essa gripe, pode sim trazer impactos grandes na nossa economia. Contudo, sempre foi assim com pandemias. Primeiro, porque temos uma infraestrutura de saúde muito deficitária para a maioria das pessoas e, segundo, porque os impactos de uma possível quarentena, que já está se ensaiando, pode ser grande nos negócios como um todo. Com isso, a maioria das empresas pode sofrer.
O efeito é bem parecido com uma a dinâmica de cascata: as empresas param, o consumo cai e todo tipo de empreendimento sofre para manter as receitas em dia. Na contra mão disso, os impostos não somem, as contas chegam para os empresários e o emprego diminui. Alguns setores sofrerão mais que os outros, e é por isso que decidi escrever esse artigo.
Na minha opinião, as empresas com receitas vindas de planos, mensalidades e assinaturas sofrerão menos. Elas são mais previsíveis em termos de receita.
Empresas com receita recorrente sofrem menos em crises
Na última semana, o mercado de capitais foi para sua prova mais dura aqui na B3. Algumas empresas chegaram a derreter 40% em uma dinâmica clara de black swam (“cisne negro” é evento raro, imprevisível e com impactos catastróficos para economia).
Por conta de uma recessão e uma queda no consumo, a gente aqui na Vindi acredita que as empresas com receita recorrente no modelo, sofrem menos às crises, se comparadas àquelas que dependem de vendas pontuais para faturar. Por simplesmente terem esse modelo, de cobrança automática, a evasão de clientes (e da receita) demora um pouco mais para acontecer. Estou falando basicamente de negócios de serviços que estão baseados nesse tipo de modelo: planos, mensalidades e assinaturas.
Para tentar ajudar os empresários que adotam o modelo de receita recorrente nas suas empresas, fiz uma analogia com a bolsa de valores brasileira (a B3), que sofreu bastante nessa semana. É um belo exercício de como o mercado disciplina e premia empresas com modelos mais sólidos ao longo do tempo.
De novo: nessa análise sobre o mercado da semana anterior, não contempla empresas do setor de saúde (farmácias, hospitais e laboratórios) que tendem a crescer com esse movimento, tirei também empresas áreas e commodities que pela natureza, já serão as mais impactadas.
As recorrentes da bolsa na última semana (de 09 a 13 de março)
As recorrentes da B3, da NYSE (bolsa de Nova York) e da Nasdaq sofreram menos que a maioria do mercado nessa semana do #coronaday. Pode ser uma coincidência ou seguir uma análise de tempo curto (5 dias de pregões) mas, algum sinal dá para notar. Especialmente em cases como a da fantástica Zoom (ZN), o SaaS de videoconferência que subiu + de 3% com a maioria das empresas do mercado americano sugerindo o home-office e tendo a necessidade de reuniões remotas. Isso é ocasional, claro. Mas, o preço de algumas ações subindo, em uma semana sangrenta para o mercado, sinaliza que empresas com receitas previsíveis são mais atraentes para investidores.
Bolsas na última semana:
- Ibovespa (-15,62%)
- NYSE (-7,64%)
- Nasdaq (-1,06%)
As recorrentes “gringas” sofreram com os efeitos da semana. Netflix caiu 2%, Salesforce caiu 3%, Zendesk caiu 3,68%, Spotify caiu 3,92%, Hubspot caiu 11,87%, Twilio caiu 13,88% e a Slack derreteu, caindo 19,48%.
Do outro lado da mesa, Adobe subiu 7%, Avalara subiu 4,08%, Zoom (ZN) subiu 3,5%, Intuit subiu 1,16%, Match Group (Tinder) subiu 0,78%, Microsoft subiu 0,51% e Google (Alphabet) subiu 0,83%, mesmo com a “semana de sangue”.
Mas, e as e brasileiras?
Para fazer uma análise do desempenho das recorrentes brasileiras na B3 tirei, obviamente, comparações com empresas de commodities e aéreas que sofreram bastante pelos impactos do petróleo. Seria injusto comparar com esse tipo de empresa.
As recorrentes Locaweb, TOTVS e Porto Seguro subiram. As educacionais Cogna (Kroton), Ser Educacional, Ânima, Estácio, a Sinqia (tecnologia), SulAmerica (seguros) e a Linx (software) caíram.
Locaweb
A estreante da bolsa segurou bem a semana. Preço da ação:
- 09/03 – R$16,60
- 13/03 – R$17,54
TOTVS
A TOTVS garantiu alta nessa semana. Software recorrente! Preço da ação:
- 09/03 – R$57,50
- 13/03 – R$57,64
Porto Seguro
A recorrente “Porto” foi uma das que conseguiu segurar a semana. Preço da ação:
- 09/03 – R$52,00
- 13/03 – R$53,52
Linx
Ao contrário da TOTVS, a Linx caiu. Teve uma queda de 7,33% na semana. Preço da ação:
- 09/03 – R$25,79
- 13/03 – R$23,90
Ânima
A Ânima Educação (HSM, São Judas, entre outras) foi a educacional que mais caiu: 20,04%. Preço da ação:
- 09/03 – R$30,64
- 13/03 – R$24,50
Cogna
A Cogna (antiga Kroton) foi uma das educacionais que mais sofreu também, caiu 19,64%. Preço da ação:
- 09/03 – R$8,30
- 13/03 – R$6,67
Ser Educacional
A Ser Educacional (Uninorte, UNG entre outras) caiu 4,81%. Preço da ação:
- 09/03 – R$20,60
- 13/03 – R$19,61
Sul América
Sul América sofreu muito mais que Porto Seguro, caiu 18,06%. Preço da ação:
- 09/03 – R$47,00
- 13/03 – R$38,51
Sinqia
A Sinqia (antiga Senior Solutions) caiu 4,12%. Preço da ação:
- 09/03 – R$17,00
- 13/03 – R$16,30
Estácio
Estácio também sofreu na semana: caiu 14,49%. Preço da ação:
- 09/03 – R$40,23
- 13/03 – R$34,40
Comparando com empresas do varejo como Hering, que caiu 13,48%, a Ambev que caiu 13,31%, a Centauro que caiu 9,17%, a Gerdau (da indústria) que caiu 18,63%, a Time for Fun (T4F) que desabou 26,77%, entre outras do varejo e da indústria, as recorrentes da B3 que não são educacionais, seguraram bem.
Ânima, Cogna (educacionais) e Sul América são as recorrentes que caíram mais que o índice Ibovespa. Ao longo do tempo, investidores preferem empresas que conseguem ser ótimas geradoras de caixa, que pagam dividendos e, obviamente, que tenham receita recorrente.
Como empresas (e empresários) podem analisar os impactos do Coronavírus nos negócios nos próximos dias
Aglomerações, atividades em conjunto e espaços de grandes fluxos de pessoas precisarão ser contidos para que a crise do Coronavírus não se agrave e isso tem, claramente, um impacto em pessoas deixando de consumir produtos e serviços. Porém, existe uma chance das empresas recorrentes sentirem menos esses impactos.
O meio de pagamento nesse momento também é essencial para sua empresa ter a chance de tentar manter a receita em casa. Se sua empresa cobra clientes em cartão de crédito e débito em conta, você tem uma vantagem. Se para manter as receitas seu cliente precisar ser motivado a pagar um boleto no banco dele, atenção.
Em um cenário de recessão, famílias tendem a escolher as necessidades primárias para pagar. É, basicamente, a seleção de qual boleto vão pagar. Caso o meio de pagamento esteja automatizado (cartão de crédito ou débito em conta) você terá a chance de convencê-lo a manter a mensalidade (e o contrato).
Se sua empresa cobra clientes em cartão de crédito e débito em conta, você tem uma vantagem. Se para manter as receitas seu cliente precisar ser motivado a pagar um boleto no banco dele, atenção.
Fiz, abaixo, uma análise rápida sobre tipos de negócios recorrentes, com um grau de risco em impacto de inadimplência, cancelamento de contratos e empresas que podem ter na mão grandes oportunidades.
Risco grande
Comércio, indústria de bens de consumo e varejo, no geral, vão sofrer bastante com uma recessão. Olhando para 2008, onde a crise teve reflexos globais, esse setor sofreu bastante por aqui. O fluxo dos shoppings, das lojas de rua e das principais marcas de varejo tende a cair bastante. Essa é uma grande oportunidade para o e-commerce, que pode de vez testar sua força, já que terá a chance de acostumar novos consumidores a comprar online.
Os supermercados e restaurantes já têm se comunicado de forma diferente na última semana através dos aplicativos de pedidos. O delivery terá um aumento do volume, com certeza, mas o setor tende a sofrer forte.
Cinemas, parques, casas noturnas, restaurantes sem delivery, cafés, lojas de departamento, postos de gasolina, aplicativos de táxi e comércios no geral, devem sofrer muito se a recessão vir. Já vimos filmes parecidos.
As pessoas vão parar de se deslocar, simplesmente assim. E, o varejo, que depende de impactos em promoções e publicidade para trazer o cliente de volta, pode encontrar um desafio enorme para manter receitas.
Risco moderado
Academias, escolas particulares (fundamentais e de ensino médio), cursos de inglês, estacionamento, psicólogos e serviços pagos através de mensalidades terão desafios, mas nada comparado ao varejo. O risco, nesse caso, é inadimplência e cancelamento de planos/contratos pelo período que durar o possível confinamento.
As pessoas vão para casa e, uma pausa no uso desses negócios, pode impactar bastante. Academias, escolas e clubes podem sofrer bastante com a evasão de clientes nos próximos dias. Atenção!
Risco baixo
Os serviços de consumo recorrente como o de energia, gás, telefonia, internet, tv a cabo, condomínio, seguros e serviços financeiros (com tarifas mensais) possuem um baixo risco de cancelamento, mas possuem um risco de inadimplência, se realmente a recessão afetar os empregos.
Mas, como são serviços recorrentes de primeira necessidade, como alimentação, esses acabam sendo priorizados nas decisões da família. Ainda mais em períodos de quarentenas.
Oportunidades
Gostaria de acompanhar o mais de perto o possível aumento de assinantes de negócios como Spotify, Netflix, Amazon Prime e Playkids, já que o confinamento das pessoas pode levar ao aumento dessa audiência. Mas, não é só esse tipo de serviço que poderia se beneficiar em caso de quarentenas.
Todo tipo de streaming (filmes e música), aplicativos de jogos e games online, aplicativos de investimento e apps de relacionamento pagos terão, com certeza, uma chance de aumentar a base de assinantes. As pessoas em casa precisarão passar o tempo e, a digitalização delas, pode virar uma baita oportunidade para assinaturas!
Empresas como a Alura, Kinvo e MeuSucesso podem aproveitar que as pessoas vão ficar em casa e ofertar preços diferenciados para aumentar a base de assinantes. É hora de usar o tempo das pessoas em casa.
Tenho certeza: empresas baseadas em receitas recorrentes vão passar por esse momento de incerteza com mais confiança daquelas que precisam convencer clientes a voltarem a comprar.