Gostam de chamar Carlos Eduardo Brandt de “pai do Pix”. Ele é chefe de estrutura do Banco Central e, muitas vezes, seu rosto e seu nome são ligados à plataforma de pagamentos instantâneos inaugurada em novembro de 2020. Na edição de 2022 do Innovation Pay, onde foi keynote speaker ao lado do economista Ricardo Amorim na palestra que encerrou o maior evento de fintechs e meios de pagamentos da América Latina, não foi diferente.
O executivo sorri sem jeito ao ouvir repetidamente a alcunha, que invariavelmente gera analogias em cascata. A metáfora evolui para sobrinhos, netinhos, tios, padrinhos do Pix… a plataforma de análise genética Genera ficaria orgulhosa da árvore genealógica que dá para traçar sobre a plataforma. Mas Brandt tangencia sutilmente a analogia e prefere, com razão, valorizar outros pontos do Pix.
No exato dia em que o sistema de pagamentos instantâneos comemorou dois anos de lançamento, o chefe do Bacen subiu ao palco do Innovation Pay e exaltou o fato de mais de 60 milhões de pessoas terem sido incluídas financeira, digital e socialmente graças à plataforma que ajudou a criar (e não da qual é genitor). E destacou, ainda, o fato de o Pix ser um enorme chassi, no qual se plugarão diversas plataformas que seguirão ajudando consumidores e empreendedores.
“É o primeiro estágio para uma inclusão mais ampla, a porta de entrada para outros serviços financeiros e digitais”, sublinhou Brandt, já prevendo as próximas estações por onde passarão os trilhos de inovação do mais novo meio de pagamento. Falou sobre Pix Internacional, Pix Garantido, Pix Recorrente, sobre a possibilidades de melhorar (ainda mais) a experiência de compras, seja em checkouts online ou estabelecimentos físicos. “Vamos seguir nessa linha estruturante”, afirmou.
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Qual a diferença entre Pix Parcelado e Pix Garantido?
O Pix foi lançado integralmente no Brasil em 16 de novembro de 2020. De lá para cá, em dois anos, o Banco Central registrou mais de 537 milhões de chaves criadas, sendo 512 milhões de pessoas físicas – o que corresponde a mais de duas chaves para cada habitante do Brasil.
Segundo o BC, mais de 131 milhões de pessoas já fizeram ou receberam pelo menos um Pix ao longo destes dois anos. Em novembro de 2022, mais de 2,5 bilhões de Pix foram enviados. Mas, como disse Carlos Eduardo Brandt, este é só o começo.
Confira, a seguir, os melhores momentos da entrevista de Carlos Eduardo Brandt para Ricardo Amorim no Innovation Pay 2022.
Plataforma co-criada e a serviço da sociedade brasileira
Eu tenho às vezes essa denominação que é colocada [de “pai do Pix”], mas na verdade esse produto é uma uma obra coletiva, de um conjunto muito grande de pessoas que estão dentro do Banco Central trabalhando para fazer a coisa acontecer. Mas não só: fora do Bacen também, de toda a indústria, de todo o mercado, em um ecossistema extremamente colaborativo para a construção de algo que hoje está fazendo dois anos.
Tem muita gente fazendo isso acontecer, e isso é o mais bonito de ver. Essa co-criação de Banco Central com toda a indústria, com todos agentes, isso é algo sensacional. Aqui não é um instrumento do Banco Central, ou um instrumento do agente A, do governo… não. É um instrumento da sociedade brasileira.
Pix como um chassi de inovação contínua
Acho muito interessante essa perspectiva de o Pix ser um um chassi, um ecossistema sobre o qual a gente tem inovações acontecendo e em vários aspectos: tanto o ecossistema de pagamento quanto o próprio ecossistema financeiro como um todo.
A gente tem essa mentalidade, essa visão de uma coisa contínua, continuada no tempo, em que a gente identifica as necessidades da nossa sociedade em termos de pagamento e de outras inovações que, de certa forma, orbitam em torno desse ecossistema de pagamentos. E, onde vão surgindo necessidades, vão surgindo tecnologias. Isso é algo permanente, que não tem um início, meio e fim.
Próximos lançamentos da plataforma
A gente tem já nosso roadmap o Pix Automático, que vai endereçar a questão dos pagamentos recorrentes… tem o Pix Internacional, que está na nossa agenda prioritária também, com objetivo de fazer com que os pagamentos internacionais sejam facilitados, seja do ponto de vista de velocidade, de curso de rastreabilidade… Temos também o Pix Garantido e vários outros produtos já identificados como necessidade que vão apoiar todo esse processo transformacional no curto prazo.
Mas acho que é importante deixar essa mensagem de que a coisa é continuada, que a gente está sempre olhando lá na frente e tentando fazer com que todas as necessidades e as inovações sejam sempre incorporadas, para que todo mundo possa explorar da melhor forma possível: os prestadores de serviços, pagamentos, as fintechs, os bancos… que eles possam explorar, e que no final das contas quem ganha é a sociedade.
O Pix Internacional tem um potencial incrível de melhorar todo o fluxo de recursos entre o Brasil e várias outras jurisdições, mas também é uma dinâmica das mais complexas.
Carlos Eduardo Brandt
Inovações do Pix no varejo físico
Tem um caminho enorme de inovações, tanto as que se prolongam nesse chassi do Pix como também as que vão aumentando a abrangência desse chassi e que são ampliadas para outros segmentos. A gente vê várias oportunidades de inovações acontecendo não só no mundo digital, onde os modelos são totalmente baseados na tecnologia, mas no mundo físico.
No varejo físico há todo um um potencial de ajustes na jornada do cliente dentro da loja, de uma experiência diferenciada, de uma alteração no processo de checkout… Toda a dinâmica tradicional de comprar o seu produto e ao final ficar aguardando ali na fila, com todo o espaço que é dedicado ao checkout, tudo pode ser bastante alterado. As inovações estão no começo, e a gente vai seguir nessa trilha estruturante nos próximos anos, com certeza
Pix como ferramenta de inclusão
É uma revolução que está começando, pois trata-se de algo que foi pensado como uma alteração estrutural do nosso ecossistema num ponto de partida em que começamos democratizando o acesso ao meio de pagamento e democratizando sobre duas óticas distintas: de quem consome o serviço de pagamento e o serviço financeiro, e também sob a ótica da oferta do serviço de pagamento, de soluções que vão prestar serviço à sociedade e trazendo aqueles que estavam de fora, que estavam excluídos do sistema.
Pagamento é uma necessidade e funciona como a porta de entrada para que a pessoa passe a ter acesso a outros serviços financeiros. E, a partir daí, ela passa a ter acesso também a outros serviços digitais fora do sistema financeiro. Você passa a dar uma inclusão digital de uma forma mais abrangente às pessoas, viabilizando o acesso a serviços inovadores. E estimula também o empreendedorismo, a inovação, justamente porque esses modelos inovadores baseados em tecnologias agora passam a contar com uma solução efetiva, simples, de baixo custo e que é muito inclusiva.
Antes do Pix, as pessoas não eram excluídas apenas do sistema de pagamentos, mas de uma série de dinâmicas sociais e econômicas por uma ausência de solução para isso. Não porque não tinham dinheiro, mas porque não tinha um meio de pagamento capaz de entregar aquele serviço à pessoa.
Carlos Eduardo Brandt
Desafio do Pix Internacional
Tem um potencial incrível de melhorar todo o fluxo de recursos entre o Brasil e várias outras jurisdições. A gente vem tentando adotar mecanismos que sejam multilaterais, ou seja, que consigam que várias jurisdições construam uma plataforma única onde todas se conectam (e a gente tem todo um arcabouço de regras para a reger toda essa troca de recursos). Me parece o mais eficiente, mas também é uma dinâmica das mais complexas, porque você está plugando de uma vez só várias instituições, lidando com regras diferentes, com sistemas de pagamentos domésticos diferentes.
Então não é um mecanismo simples de ser implementado, mas é algo que a gente vem perseguindo e acompanhando com muito carinho. Mas, enquanto isso não acontece, a gente está olhando também para outras formas de se viabilizar todo esse fluxo de recursos com o que já tem hoje.
Já existe a possibilidade de uma junção com a modernização da regulamentação cambial que está em curso com o que já existe no Pix. A gente já vê soluções bem interessantes que utilizam a plataforma Pix inclusive para fazer a troca de recursos entre Brasil e exterior já olhando para essa modernização da legislação cambial. Então só para dizer que a gente está explorando várias alternativas porque, sem dúvida, é algo que realmente tem um impacto positivo muito grande nessa dinâmica de internacionalização da nossa economia.
Sucesso de usabilidade da plataforma
Tínhamos a obsessão por entregar um meio de pagamento que fosse extremamente intuitivo e fácil de ser utilizado – ao lado da segurança, que obviamente é um pilar fundamental. Junto com a indústria, definimos padrões de requisitos mínimos para a experiência do cliente no sentido de permitir que qualquer pessoa, não importa em qual prestador de serviço de pagamento ela estivesse conectada, pudesse ter essa garantia de experiência fluida, simples o suficiente para permitir com que ela fosse efetivamente incluída.
Vamos lembrar que hoje a gente tem um número de mais de 60 milhões de pessoas que foram incluídas ou que fizeram a sua primeira transação digital com Pix. Essa foi a coisa basilar de todo o ecossistema. Eu sempre conto a história desse processo de construção desses requisitos de experiência: tínhamos experts em experiência do usuário discutindo soluções e entregando alternativas. Mas, sempre que havia alguma dúvida, a gente levava essas soluções para uma criança, para que ela tivesse uma experiência realmente simples. Isso foi a base. E aí você entrega produtos adicionais, como Pix Recorrente, Pix Garantido, entrega soluções de formas diferentes de iniciar o pagamento… Você dá uma experiência de tap and go, de pagamento por aproximação.
Carlos Eduardo Brandt: inclusão do Pix vai além do “case de sucesso”
Do meu ponto de vista que talvez até pessoal, [meus produtos favoritos do Pix são] todos aqueles que têm uma pegada muito forte de inclusão, de trazer as pessoas para dentro do sistema. Não porque seja uma solução bonita, mas porque elas passam a ter uma cidadania digital, tendo acesso a serviços que antes não tinham. Elas não eram excluídas apenas do sistema de pagamentos, mas de uma série de dinâmicas sociais e econômicas por uma ausência de solução para isso.
Então, quando a gente traz um produto como o Pix recorrente, o que acontece? Passamos a viabilizar para as pessoas que querem, por exemplo, terem um streaming de música e não conseguem – não porque não têm dinheiro, mas porque não têm um meio de pagamento capaz de entregar aquele serviço digital para a pessoa.
Confira um trecho da participação de Brandt no Innovation Pay 2022
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Mais conteúdos do Innovation Pay
Além das palestras no palco principal, o Innovation Pay contou com episódios especiais do podcast Dentro do Ringue em vídeo em um estúdio montado no local do evento. Confira a playlist abaixo, com todos os conteúdos gravados com grandes nomes do mercado de pagamentos e serviços financeiros do Brasil!